– Vamos tirar a armadura para
evitar lesões.
– Está
sentido dor em algum lugar?
Aquiles
levantou vagamente o rosto de forma irônica.
– “As
costelas” é uma boa resposta? – Ele questionou enquanto retiravam a armadura
amaçada para evitar problemas.
–
Quais? – O cultista questionou, passando o condutor de magia que
automaticamente direcionou um raio verde de aura para dentro da armadura de
cota de malha vagamente rasgada.
– Acho
que todas. – Aquiles afirmou, tentando se ajeitar enquanto os sangramentos
internos lhe arranhavam. – Dói um pouco ao respirar, mas estou bem.
– Você
realmente está ferido? – O cultista que tirou a armadura o questionou
impressionado. – Qualquer um ficaria eufórico ou preocupado com os seus
ferimentos.
–
Qualquer um ficaria? – Ele questionou com uma risada vaga. – Sim, qualquer um
ficaria assim... mas um líder não é qualquer um... – Ele finalizou com mais uma
risada irônica enquanto a cura mágica dos cultistas fazia efeito.
Ao seu
lado, Voltten correu, não questionando o estado do amigo, ele apenas trocou
alguns olhares. Depois de uma leve sensação de segurança, Voltten direcionou
sua visão para o necromante que lhe surpreendeu imediatamente.
Ao
contrário da magia feita com as projeções de braços antes, ele criou uma esfera
de energia – vagamente semelhante a feita por Ortros, Parysas e Sansa na
invasão a Cartan – roxa e negra. Cada objeto que encostasse nela adquiria um
foco de energia da esfera que quase que imediatamente o repelia com uma força
de energia contrária, tornando um escudo mágico que refletia qualquer forma de
dano.
Glans
sentia dois dos seus punhos lhe golpeando antes de parar para analisar a
situação, os espadachins quase foram arremessados para trás pelos punhos e as
flechas do arqueiro batiam na barreira e caiam assim como em uma parede.
–
Voltten? – Glans se virou, esperando uma resposta do mago.
–
Segundo em comando de novo... – Voltten afirmou em lamentos baixos e internos,
mas logo se recompôs. – É uma barreira mágica, não ataquem, ela acumula dano.
–
Acumula? – Os cultistas felizes perguntaram simultaneamente.
–
Teoricamente...
Atrás
da barreira, o necromante se aproximava deprimido de seu teclado de marfim
completamente destruído e arranhado. O fogo da magia de Voltten ainda queimava
em seu corpo e explodia vagamente sua armadura, transformando em cinzas e pó
suas roupas velhas.
Ele pegou
os pedaços das teclas de marfim como se fossem o último resquício de sua
humanidade. As teclas brancas sujas pelo tempo foram reduzidas a pó pelo
próprio necromante que chorava ao realizar tal magia. Seus murmúrios eram
interrompidos por sua mandíbula solta.
Sussurros
profundos e simbólicos proferidos em uma língua ancestral esquecida pelos vivos
e abraçada pelos seguidores do espírito do Deus da Morte, transformavam um
grande punhado de pó de marfim em diversas estalactites afiadas, todas
flutuando sem rumo ao seu redor.
A
barreira sucumbiu vagamente com uma explosão de ventos gélidos. Quando o ser
pálido se virou, sua armadura já estava marcada pela explosão e sua alma pela destruição
completa de sua paixão material.
Sem
nem ao menos perceber, o necromante já havia virado um escravo de sua própria
fé, um ser guiado apenas pelo seu Deus, apenas mais um seguidor sem rumo que
seguia ordens maiores, uma cria de necromante que um dia já foi uma pessoa.
Os
cultistas encararam a situação de forma receosa, enquanto Voltten e Glans
imediatamente priorizaram a proteção de Aquiles, que ainda não se levantara.
–
Glans! – Voltten gritou, arremessando mais uma bola de fogo para atrair a
atenção do necromante, que rapidamente direcionou as estalactites em uma
barreira.
Após
isso, moldando rapidamente o marfim, o necromante direcionou todas suas
estalactites para o guerreiro, mas, antes mesmo que conseguisse perceber, acabou
por atingir o draconato, tendo suas estalactites arranhando a carapaça de
Glans.
O
necromante nem raciocinou mais sobre o quão forte o draconiano era, apenas
focou em tentar interferir internamente em seu corpo por meio de suas veias,
mas seu estado instável não lhe dava tanta precisão. Rapidamente o marfim foi
reunido novamente e as estalactites moldadas para o próximo ataque.
–
Voltten, tá ruim de ver, como está indo as coisas? – Aquiles questionou ao
desviar o olhar para os brilhos mágicos, que eram discernidos em meio a sua
visão vagamente embaçada.
– Glans
foi atingido, mas superficialmente. – O mago afirmou com os olhares percorrendo
o cenário buscando uma brecha. – Os espadachins estão receosos.
– Eles
não vão aguentar um ataque direto. – Respondeu friamente. – Se Glans foi ferido
superficialmente, as armaduras brancas deles não vão aguentar um golpe
sequer... – Aquiles gritou vagamente com um pouco de dor, enquanto o brilho
verde envolvia seu peito e seus músculos aumentavam relativamente. – Nossa!
Essa é a cura mais extasiante que eu já senti!
– Está
pronto para o combate? – Um dos cultistas assustados questionou ao ver o elfo
se levantando com toda vontade possível.
–
Hum... – Ao analisar o combate, Aquiles se pôs em um estado de análise da
situação.
Glans
estava golpeando as paredes de marfim que o necromante moldava como defesa, ao
mesmo tempo, os cultistas espadachins desviavam e fugiam sem rumo de
estalactites que quase os atingiam.
– Não,
ainda não... – Afirmou analisando ainda mais a situação de Glans, vendo o que
era necessário. – Precisamos de uma forma de quebrar a barreira...
– As
bolas de fogo não serão capazes. – Voltten afirmou receosamente. – Se os socos
de Glans não estão surtindo efeito, minhas magias não vão causar nada a mais.
Podendo até ser pior, se quebrar a barreira de uma distância tão próxima dele,
talvez dê uma oportunidade de ataque para o necromante.
– Por
isso a bola de fogo vai ser a finalização, ele já levou uma no seco, mais uma
pode destruir a armadura ou defesas dele. – Aquiles raciocinou, pensando uma
forma de destruir a barreira de marfim. Confuso e intrigado, a procura de uma
resposta, depois de olhar para suas mãos uma ideia lhe surge. – É isso!
Aquiles
tirou as luvas e braçadeiras da armadura élfica dourada, colocando-as junto do
peitoral que os cultistas haviam tirado. Logo em seguida, ele tirou as placas
das pernas, ficando apenas com a cota de malha e as botas.
– Ei,
os de roupa branca, procurem por armaduras de metal e tragam aqui! – Aquiles gritou,
se reunindo com os cultistas assustados. – Vocês são sacerdotes, certo?
– Hum?
– Os dois se entreolharam antes de assentir. – Sim...
– A
magia da vida inclui todos os domínios do universo como base. – Aquiles pegou
uma das espadas élficas e apontou para a pilha das armaduras. – Conseguem
transmutar esse metal élfico em uma arma pesada?
– Hum?
– Os três cultistas próximos e Voltten questionaram rapidamente.
–
“Transmutar”? – Voltten perguntou de relance. – Você quer dizer alquimia?
– Sim,
não quero decompor algo. – Aquiles afirmou cutucando vagamente a pilha de
armaduras. – Eu preciso que vocês moldem tudo em uma arma pesada, conseguem?
–
Alquimia não é tão simples! – Um cultista afirmou. – Não pertence
necessariamente aos domínios da vida.
– Conseguimos
fazer por magia branca, mas precisamos de tempo para isso! – O segundo afirma.
Aquiles
sorriu vagamente.
–
Quanto tempo aguenta aí, Glans? – Aquiles gritou de forma irônica.
–
Quanto precisamos?
– Do
máximo!
– Hum!
– Glans bufou ironicamente de raiva. – Não chegar nem perto do meu limite.
Matheus Freitas: Caraca Glans, não te conheci assim não viu...
– É
isso que eu queria ouvir.
– Eu
sinto que sua confiança só está derretendo os neurônios dele. – Voltten
comentou ironicamente. – Trate de conseguir essa arma pesada rápido.
À
medida que os segundos passavam, os dois espadachins traziam cadáveres de
soldados élficos de armadura, boa parte deles sem uma parte da veste ou até
mesmo sem partes do corpo, mas foram reunidos mais um peitoral, duas
braçadeiras e um elmo.
– Isso
é o suficiente? – Aquiles questionou, encarando os cultistas assustados.
– O
que você quer?
Aquiles
pegou uma das espadas curtas e apontou.
–
Transforme isso num cilindro relativamente grosso e coloque uma cabeça de
marreta um pouco antes do final dela. – Aquiles falou, jogando a espada junto
ao monte.
–
Glans manuseando essa arma vai ser tão útil? – Briseis questionou intrigada. –
Não é pequena demais?
–
Glans? – Questionou erguendo os olhos vagamente. – Eu que vou usar a arma.
–
Espera. – Os espadachins questionaram encarando Aquiles. – Você vai sair por aí
empunhando uma marreta e uma espada?
– Sim.
– Aquiles não prestou mais atenção neles, apenas se focando na alquimia dos
cultistas.
–
Como?
– O
nome disso é “de dez anos de treino excessivo que no fim foi útil”. – Ironizou
de forma direta.
Orações
foram feitas pelos cultistas após alguns segundos de preparo.
Raios
verdes formaram um ciclone esmeralda, exalados de um círculo alquímico
desenhado na pedra da catedral. A luz rodeou e envolveu totalmente as partes de
armadura e espada.
No
centro do círculo, elas se uniram como uma esfera de metal líquido ardente, mas
em questão de segundos, tomaram forma como uma marreta pesada.
Aquiles
instintivamente estendeu a mão para pegar em seu cabo, logo o contato com o
metal alquímico entrou em sincronia com a pele do elfo, que retraiu vagamente
enquanto os raios e ciclones verdes diminuíam.
– Está
feito. – Os cultistas afirmaram simultaneamente.
A
marreta, apesar de improvisada, era incrivelmente robusta. Um modelo de dois
lados iguais – diferente das de um lado chato e um lado de pico, comumente
usada nos Cavaleiros Negros – e ambos com detalhes que se assemelhavam muito
com raízes de uma árvore se formando, seguindo para o punhal de tronco dourado
da arma.
–
Golden Wood, mesmo sendo uma arma improvisada eu a nomeio assim. – Aquiles afirmou,
a manuseando vagamente enquanto se confortava na situação. – Voltten, está
pronto?
– Hum?
– O mago questionou de relance. – Sim!
–
Perfeito.
Aquiles
respirou fundo, preparando o que aconteceria após aquilo.
–
Glans! Recuar! – Gritou para o draconato, que estava até aquele momento, distraindo
o necromante.
– Hum?
– Glans resmungou, dando passos para trás, ainda focado no necromante.
–
Aquiles, o que devemos fazer? – Os cultistas o questionaram, assustados, eles
estavam prevendo a estratégia ousada do cavaleiro.
–
Quando Voltten arremessar a bola de fogo, vocês partirão para cima. – Aquiles falou,
ficando exatamente na linha de trás de Glans, a poucos metros do mesmo.
–
Glans, una as mãos, e dê um gancho duplo quando eu der abertura. – Aquiles comandou,
respirando profundamente. – Mas por agora, mostre o quão forte a combinação da
força e da carruagem pode ser.
O
draconato começou a rir vagamente, enquanto o necromante se aproximava
lentamente com a poeira de marfim pronta a para ser moldada.
– Vai!
– Aquiles gritou mais uma investida.
Glans
começou a correr novamente, preparando um soco falso que fez o necromante armar
a barreira de marfim, foi então que Aquiles entrou em cena.
Assim
como os cultistas se apoiaram nos ombros do draconato, o cavaleiro fez o mesmo,
mas usando e abusando da sua combinação de armas Davi Golias.
Golden
Wood deu apenas um golpe, mas um golpe certeiro. A marreta quebrou o marfim tal
como uma parede sólida, mas antes que a atuação do cavaleiro acabasse, a
segunda espada curta foi usada como um segundo golpe improvisado com um giro.
O olho
de mosca viu aquilo em câmera lenta e logo acionou seus movimentos para defesa,
porém era tarde demais, a espada já havia sido fincada em seu peitoral
quebrado.
Logo
em seguida, Glans fez o ordenado por Aquiles e lhe golpeou com um gancho direto
na mandíbula quebrada, fazendo-a quebrar ainda mais em pedaços – uma fratura
extremamente desconfortável de ver.
O seu
corpo levantado com o ataque do draconato para a bola de fogo que foi expelida e
o atingiu de forma certeira, jogando-o para trás com uma explosão ardente em
chamas.
Deitado
aos pés de seu órgão com seu corpo e armadura destruídos, a única coisa que o
necromante sentia era as brechas de seu corpo sendo esfaqueadas pelos
espadachins. Enquanto seu sangue pútrido escorria, seu espirito se auto
consumia, destruindo todos as suas crias e efeitos de magia. Matheus Freitas:
Eu perguntei ao Tisso o que diabos era esse órgão, mas ele me explicou que é um
tipo de instrumento semelhante ao piano, só que muito maior e usado
principalmente em grandes catedrais. Agora vem a pergunta, de onde diabos ele
tirou isso? Tisso: Ter uma cidade subterrânea é ok, agora uma igreja nela, não.
:) Matheus Freitas: Ok, você me venceu... Mas cidades subterrâneas existem
e eu conheço algumas, mas esse órgão foi a primeira vez.
– Ele
conseguiu? – O arqueiro questionou, pasmo enquanto escutava tossidas e
respiradas fortes em seu lado. – Hum? Voltten!
O mago
estava caído no chão, segurando seu cajado e coberto pelo seu manto branco.
– Eu estou
bem... – Ele afirmou, fazendo um sinal positivo com a mão.
– Um
grupo de quinze soldados não conseguiu sobreviver, como conseguimos ganhar com
apenas metade? – Briseis perguntou para Aquiles, que estava se estabilizando.
– Hum?
– O elfo murmurou curioso. – Bem, não somos soldados normais. – Aquiles falou,
se aproximando de Glans e batendo vagamente em seu peito enquanto se apoiava
com a marreta no chão. – E também tivemos uma coordenação de time. Estratégias
podem ganhar mais guerras do que números.
–
Sim... – Glans concordou, se espreguiçando e olhando para os lados. – Como
vamos sair?
– Deve
ter uma parede falsa aqui. – Aquiles respondeu de forma calma, se dirigindo a
um dos bancos da igreja que ainda estava inteiro. – Vamos deixar isso para nós
do futuro resolver, por agora um descanso.
Glans
concordou e caminhou lentamente para conferir o estado de Voltten. Ao mesmo tempo,
Briseis se direcionou para Aquiles.
– Você
disse que tem lamentos para discutir, não é? – Ela perguntou com a voz tão
calma quanto um lago.
– Sim,
eu disse... – Aquiles confirmou, se colocando em posição pensativa. – Chuto que
você quer ouvir isso agora.
– Sim.
–
Certo, mas é uma história meio longa...